Validade da ´cláusula de raio´ em shopping centers

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Validade da ´cláusula de raio´ em shopping centers

Não é abusiva a ´cláusula de raio´, inserida em contratos de locação de espaço em shopping centers. A decisão é da 4ª Turma do STJ, para quem “os shoppings constituem uma estrutura comercial híbrida e peculiar e as cláusulas extravagantes servem para garantir o sucesso econômico do empreendimento”. O caso é oriundo de Porto Alegre.

O acórdão do julgamento, ocorrido em 10 de maio último, foi publicado anteontem (9).

A chamada ´cláusula de raio´ proíbe os lojistas de um shopping de explorar o mesmo ramo de negócio em um determinado raio de distância, mesmo que seja em outro centro comercial, ou até mesmo em loja isolada. O objetivo seria restringir a concorrência de oferta de bens e serviços no entorno do empreendimento.

Na origem, o Sindicato dos Lojistas do Comércio de Porto Alegre ajuizou ação declaratória de inexigibilidade contra as proprietárias do Shopping Iguatemi (Maiojama, Ancar, Lasul e LRR Participações) para que fosse declarada a nulidade da ´cláusula de raio´ (com 3.000 metros de extensão) inserida nos contratos firmados com os lojistas locatários do empreendimento.

O objetivo era o de impedir lojistas estabelecidos no Iguatemi de abrir novas unidades no Shopping Bourbon Wallig.

A sentença de primeiro grau, proferida pelo juiz João Ricardo dos Santos Costa, da 16ª Vara Cível de Porto Alegre – atualmente presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) – negou os pedidos da entidade dos lojistas. Ainda no início da lide, uma decisão da 16ª Câmara Cível do TJRS deu efeito suspensivo a um agravo, para impedir a vigência da cláusula.

Meses depois, ao prover a apelação do Sindilojas, o TJRS confirmou a tutela antecipada e fixou três pilares decisórios sobre a ´cláusula de raio´:

1) “Viola o princípio da livre concorrência com os outros shoppings”;

2) “Cria obstáculos para os empreendedores interessados em expandir o negócio”

3) “Acarreta prejuízos ao consumidor, que é induzido a frequentar determinado centro de compras para encontrar o estabelecimento que procura”.

Segundo o julgado do STJ que agora deu ganho de causa ao Iguatemi e às empresas suas controladoras, “a modalidade específica do contrato entre os lojistas e shopping – incluindo a ´cláusula de raio´ – objetiva a viabilização econômica e administrativa, bem como o sucesso do empreendimento, almejados por ambas as partes”. (REsp nº 1535727).

Leia como o Boletim de Jurisprudência do STJ resume a controvérsia

DIREITO EMPRESARIAL.

LEGALIDADE DE CLÁUSULA DE RAIO EM CONTRATO DE LOCAÇÃO DE ESPAÇO EM SHOPPING CENTER.

Relator: Min. Marco Buzzi, julgado em 10/5/2016.

1. Em tese, não é abusiva a previsão, em normas gerais de empreendimento de shopping center (“estatuto“), da denominada ´cláusula de raio´, segundo a qual o locatário de um espaço comercial se obriga – perante o locador – a não exercer atividade similar à praticada no imóvel objeto da locação em outro estabelecimento situado a um determinado raio de distância contado a partir de certo ponto do terreno do shopping center.

2. Para o sucesso e viabilização econômica/administrativa do shopping center, os comerciantes vinculam-se a uma modalidade específica de contratação. Entre as diversas cláusulas extravagantes insertas no contrato de shopping center – a despeito da existência de severa discussão doutrinária a respeito da natureza jurídica do ajuste, podendo ser considerado sociedade, locação, contrato coligado, misto, atípico, de adesão, entre outros -, há efetivo consenso de que todas servem para justificar e garantir o fim econômico almejado pelas partes.

3. Nessa conjuntura, é possível citar, dentre essas disposições contratuais: ´res sperata´, aluguel mínimo, aluguel percentual, aluguel dobrado no mês de dezembro, fiscalização da contabilidade, imutabilidade do ramo de negócio, impossibilidade de cessão ou sublocação e, também, a denominada ´cláusula de raio´, objeto do caso aqui analisado.

4. De acordo com a ´cláusula de raio´, o locatário de um espaço comercial se obriga, perante o locador, a não exercer atividade similar à praticada no imóvel objeto da locação em outro estabelecimento situado a um determinado raio de distância daquele imóvel. Em que pese a existência de um shopping center não seja considerado elemento essencial para a aplicação dessa cláusula, é inquestionável que ela se mostra especialmente apropriada no contexto de tais centros comerciais, notadamente em razão da preservação dos interesses comuns à generalidade dos locatários e empreendedores dos shoppings.

5. Além disso, a ´cláusula de raio´ não prejudica os consumidores. Ao contrário, os beneficia, ainda que indiretamente. O simples fato de consumidor não encontrar em todos os shopping centers que frequenta determinadas lojas não implica efetivo prejuízo a ele, pois a instalação dos lojistas em tais ou quais empreendimentos depende, categoricamente, de inúmeros fatores. De fato, a lógica por detrás do empreendimento se sobrepõe à pretensão comum do cidadão de objetivar encontrar, no mesmo espaço, todas as facilidades e variedades pelo menor preço e distância.

6. Ademais, nos termos do ordenamento jurídico pátrio, ao proprietário de qualquer bem móvel ou imóvel – e aqui se inclui o(s) dono(s) de shopping center – é assegurado o direito de usar, gozar e dispor de seus bens e, ainda, de reavê-los do poder de quem injustamente os possua. Denota-se que, para o exercício desses atributos inerentes à propriedade, principalmente a permissão do uso por terceiros, pode o proprietário impor limites e delimitar o modo pelo qual essa utilização deverá ser realizada.

7. Assim, diversas são as restrições que pode o dono impor aos usuários do estabelecimento (vestimentas, ingresso com animais, horário de funcionamento, entre outros). Assim inúmeras são as cláusulas contratuais passíveis de inserção nos contratos de locação atinentes aos centros comerciais híbridos, sem que se possa afirmar, genérica e categoricamente, sejam elas abusivas ou ilegais, uma vez que, em última análise, visam garantir a própria viabilidade do uso, a implementação do empreendimento e, pois, o alcance e incremento real da função social da propriedade.

8. Além do mais, o fato de shopping center exercer posição relevante no perímetro estabelecido pela ´cláusula de raio´não significa que esteja infringindo os princípios da ordem econômica estampados na CF, visto que inserções de´cláusulas de raio´ em determinados contratos de locação são realizadas com o propósito de servir à logística do empreendimento. Aliás, a conquista de mercado resultante de processo natural fundado na maior eficiência de agente econômico em relação a seus competidores não caracteriza ilícito, tanto que prevista como excludente de infração da ordem econômica (§ 1º do art. 36 da Lei n. 12.529/2011).

9. Por fim, não se diga que o STF analisou a constitucionalidade da ´cláusula de raio´ por ofensa ao princípio da livre concorrência. Afinal, a Súmula nº. 646 do STF, a qual prevê que “ofende o princípio da livre concorrência lei municipal que impede a instalação de estabelecimentos comerciais do mesmo ramo em determinada área“, não diz respeito às cláusulas contratuais estabelecidas em pactos firmados entre locador e locatário, mas sim a imposições de política pública municipal, ou seja, a situações em que o próprio poder público impede e inviabiliza a implementação do princípio da livre concorrência.

Fonte: Espaço Vital (http://www.espacovital.com.br/publicacao-34181-validade-da-acuteltigtclausula-de-raioltigtacute-em-shopping-centers)

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